HISTÓRIA DE PORTUGAL MEDIEVAL 2 - Os Poderes na Baixa Idade Média.

Temática

OS PODERES NA BAIXA IDADE MÉDIA

Trabalho a desenvolver

Elabore um ensaio (partindo do artigo que encontra no URL infra indicado) sobre o relacionamento entre a coroa e os concelhos em matéria de defesa dos núcleos urbanos, na Baixa Idade Média portuguesa.

RIBEIRO, Maria do Carmo - "Governar e defender a cidade medieval: o amuralhamento das cidades medievais portuguesas no tempo de D. Fernando I (1367-1383)". In Andrade, Amélia Aguiar; Silva Gonçalo Melo da (eds.). Lisboa: Instituto de Estudos Medievais, Câmara Municipal de Castelo de Vide, 2021, pp. 325-345.

 

TRABALHO / RESOLUÇÃO: Os Poderes na Baixa Idade Média.

Apesar do alicerçamento fronteiriço do reino com Afonso III, o que se seguiu, na Baixa Idade Média portuguesa, não foi necessariamente um tempo de paz.
Sucessivos conflitos com Castela mantiveram acordada a necessidade dum constante investimento na defesa, enquanto a crescente importância
i, para não dizer centralidade, socioeconómica das cidades, as transformava em alvos tácticos preferenciais, nas diversas estratégias que os vários actores ibéricos tentavam levar a cabo.

Se pelo tempo de Fernando I a defesa do território estava solidificadaii, a verdade é que se cimentava a consciência de como os centros urbanos eram os novos e apetecíveis alvos da guerra, muito mais do que os castelos isoladosiii. Estas cidades que, por vezes, tinham sido dispostas de acordo com uma lógica de defesa do território conquistadoiv, viam-se agora transformadas no foco da guerra que, inicialmente, tentavam manter à distância.

O esforço para lhes proporcionar meios defensivos, vai ser especialmente visível no tempo do Rei Formoso, o “construtor de cercas”v, por mais que estas obras necessariamente longasvi (às vezes secularesvii) fossem muitas vezes resultado de esforços multigeracionais: como vemos no caso de Ponte de Limaviii onde Fernando I finaliza uma obra lançado pelo seu pai Pedro I, ou nos do Porto, Elvas e Évoraix, onde remata obras iniciadas nos tempos do avô Afonso IV.

Seja como for é com Fernando I, e os seus cíclicos envolvimentos no conflito dinástico pelo trono de Castela, que vemos um trabalho de verificação do estado dos muros, torres, cavas de redor, poços, cisternas, portas, paredes, travessas, pontes levadiças e cadafalsosx e um esforço continuado “de construção, de restauro e reforço”xi.

Num contexto em que a antiga autonomia dos concelhos se ia esboroando face aos pulsos gravitacionais da Coroa e dos senhores terratenentesxii, e que a defesa comum começava a exigir soluções diversas das inicialmente contratualizadas nos foraisxiii, os concelhos urbanos (esses habituais suportes da centralização realxiv) vão ter um papel essencial.

Essenciais na constituição dum corpo nacional de besteiros, tropas permanentes e de elite, sujeitas a treino contínuo; dependentes já não de senhores ou das oligarquias dos concelhosxv donde vinham, mas às ordens dum anadel-mor que só respondia ao monarcaxvi. Mas antes de mais, essenciais no esforço de amuralhamento que fechou o fosso entre o crescimento urbano que fazia transbordar os burgos das muralhas e a

premente necessidade de protecção; caso de que Lisboa era exemplo particularmente manifestoxvii.
A afastarem-se dum modelo tão bem-sucedido que se espelhou até na estrutura social
xviii, o novo contexto empurrou as cidades e vilas para uma predominânciaxix que exigiu novos arranjos com o poder real. Novos arranjos que, pressupondo o investimento da Coroa, implicavam inevitavelmente um esforço, tanto pecuniário como humano, por parte dos municípios ou dos senhorios envolvidosxx; criando uma situação de múltiplos modos de financiamento, uma situação a que Mesqui chamará parcelamento de financiamentosxxi.

Uma situação multiforme e fluída que, obra a obra, e dentro do tempo longo que uma determinada obra podia levar, criava situações que implicavam não só o investimento dos próprios rendimentosxxii, como regularmente davam lugar a “pedidos” reais às Cortesxxiii, fintas e outros impostos extraordinários, empréstimos forçados ou de mercadoxxiv, concessões de direitos a materiais construtivos, reduções ou simples isenções de taxasxxv, privilégios específicos a artes ou classes profissionaisxxvi e quase sempre, quase inevitavelmente, lugar a anúduvas.

A anúduva, requisição forçada de trabalho braçal (mesmo que remível contra pagamento monetário: 30 soldos para os donos de bois e 10 para quem não os tinha, por 8 dias de trabalho anuais na construção das muralhas do Porto em 1367xxvii), era aplicável não só em casos de manutenção e restauro de estruturas pré-existentesxxviii, como no levantamento de novas, como vimos acontecer com a Cerca Nova de Óbidosxxix ou com o grande projecto para Lisboaxxx. Obrigação que caía recorrentemente sobre as populações dos termos extramurosxxxi.

Um esforço colectivo que tocou a sociedade da altura nos seus vários níveis e que, respondendo à necessidade geral de defesa guiada pela Coroa, não deixou por isso de responder a necessidades específicas e locais. Fossem estas já pré-existentes (como vimos no caso da atenção devotada à protecção do eixo Rossio – Ribeira em Lisboaxxxii) ou apenas ainda só antecipáveis, como quando os perímetros defensivos abarcavam espaços ainda por urbanizar, numa clarividente antecipação dum expectável crescimento urbano (como aconteceu em Ponte de Lima, Beja, Bragaxxxiii ou Évoraxxxiv).

Um esforço que não foi despiciendo no curto prazo (nas guerras que acompanharam o ocaso da dinastia Afonsina e o alvor da de Avis) e que no longo, longo prazo, nos continua a condicionar a morfologia de alguns centros urbanos que, como fósseis de muralhas que já não existem, ainda lhes carregam as marcasxxxv.

 

Bibliografia
Livros
MATTOSO, José; SOUSA, Armindo – Segundo Volume A Monarquia Feudal (1096 - 1480). Mattoso, José (dir.) – História de Portugal. s.l.: Círculo de Leitores, 1993. RAMOS, Rui (coord.) – História de Portugal. Lisboa: A Esfera dos Livros, 2009.  

Artigos
AFONSO, Carlos Filipe – “Qui dixerit – a las armas” indícios de atividade militar no quotidiano urbano na Reconquista. In Andrade, Amélia Aguiar; Silva, Gonçalo Melo da (eds.) – A Vida Quotidiana na Cidade na Europa Medieval. Lisboa: Instituto de Estudos Medievais, 2022. pp. 441 – 452.
MELO, Arnaldo Sousa; RIBEIRO, Maria do Carmo –
Construction Financing in Late Medieval Portuguese Towns (14th – 16th Centuries). In Carvais, Robert, et al (eds.) – Nuts and Bolts of Construction History. Culture, Technology ad Society. Paris: Picard, 2012, vol. 2, pp. 305 – 312.
RIBEIRO, Maria do Carmo –
Governar e Defender a Cidade Medieval: o amuralhamento das cidades medievais portuguesas no tempo de D. Fernando (1367 - 1383). In Andrade, Amélia Aguiar; Silva, Gonçalo Melo da (eds.) – Governar a Cidade na Europa Medieval. Lisboa: Instituto de Estudos Medievais / Câmara Municipal de Castelo de Vide, 2021. pp. 325 – 345.

i RAMOS, R. – História de Portugal, p. 152.
ii RIBEIRO, M.C. – Governar e Defender a Cidade Medieval, p. 328.
iii RIBEIRO, M.C. cit. ii, pp. 340 – 341.
iv RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 327.
v António de Oliveira Marques in RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 341.
vi RIBEIRO, M.C. cit. ii, pp. 341 – 342.
vii MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. – Construction Financing in Late Medieval Portuguese Towns, p. 305.  

viii RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 332.
ix RIBEIRO, M.C. cit. ii, pp. 338 – 339.
x RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 329.
xi RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 341.
xii MATTOSO, J.; SOUSA, A. – Segundo Volume A Monarquia Feudal, p. 531.
xiii AFONSO, C.F. – “Qui dixerit – a las armas”, p. 448.
xiv MATTOSO, J.; SOUSA, A. cit. xii, p. 372.
xv MATTOSO, J.; SOUSA, A. cit. xii, p. 221.
xvi MATTOSO, J.; SOUSA, A. cit. xii, p. 526.
xvii RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 341.
xviii AFONSO, C.F. cit. xiii, p. 443.
xix RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 327.
xx RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 342.
xxi Jean Mesqui in MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 305.
xxii MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 306.
xxiii MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 307.
xxiv MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 308.
xxv MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 309.

xxvi MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 310. 

 xxvii MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, p. 309. 

 xxviii AFONSO, C.F. cit. xiii, p. 448.
xxix RIBEIRO, M.C. cit. ii, pp. 339 – 340.

xxx RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 343.
xxxi MELO, A.S.; RIBEIRO, M.C. cit. vii, pp. 308 – 309. 

 xxxii RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 336.
xxxiii RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 333.
xxxiv RIBEIRO, M.C. cit. ii, p. 339.
xxxv RIBEIRO, M.C. cit. ii, pp. 332 – 333.

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