“Gauche” o Schumann, o Miguel e o Tchaikovsky.
Uma cena no Porto Canal faz-me ir ouvir outra vez Schumann e desencalho versões da Martha Argerich e da Yuja Wang só para voltar à conclusão de partida que do Schumann não gosto porque o Schumann é barulho geracional de há 4 ou 5 gerações atrás e eu a gostar de barulho geracional é o da minha geração.
E depois lembro-me do Miguel Esteves Cardoso há uns (poucos) tempos a chorar-se que gostava muito de Tchaikovsky mas depois os amigos snobs lhe ensinaram que gostar de Tchaikovsky era “gauche” (“gauche” aqui, que do francês de canhoto em inglês virou canhestro, que é como quem diz básico, pouco-sofisticado) e lá foi o moço mortificar-se com sabe deus nosso senhor o quê porque o povão ouviu Mozart ou Vivaldi num elevador de centro-comercial ou num anúncio de iogurtes e a conclusão é: o Tchaikovsky tem de ir para o lixo, porque se o povo básico gosta dele, é porque ele é básico também, e se ele é básico nós, que definitivamente estamos acima de correr como rebanhos atrás (ou à frente) de estímulos básicos agora todos achamos o Tchaikovsky é coisa da Arrentela e detestamos e nunca ouvimos.
Ao Miguel (a única existência que francamente invejo) só lhe falta cair outra Biblioteca de Alexandria nos cornos para ver se ultrapassa o defeito de fabrico: achar que “snob” é elogio. A cena mais irremediavelmente portuguesa no português mais orgulhosamente inglês que a nação já produziu.
“Snob” é, até etimologicamente, insulto. A bendita mãe inglesa do Miguel havera do saber, se soubesse latim que chegasse.
Comentários
Enviar um comentário