Wes Anderson, ou uma pequena diatribe sobre o cansaço não da opacidade, mas da vacuidade da quirkiness dos millennials.
Eu no mail de há bocado dizia que havia alguma coisa de
geracional nesta quirkiness reinante, de que o Wes Anderson é um expoente, e
que é claramente uma cena dos millennials, praticamente hegemónica entre a
vossa élite bem pensante e bem alimentada. As brilhantes Tina Fey e Amy Poehler
uma vez apresentaram o Anderson nuns prémios quaisquer com uma piada de como
ele tinha chegado à gala na sua habitual bicicleta feita de peças de tuba
compradas em antiquários e a quirkiness é um bocado isto, uma bricolage nova
feita de peças velhas que sai engraçada e colorida e rebelde pelo menos à
superfície.
Este modelo é verdadeiramente vosso por mais que a obrigação
da rebeldia seja de todas as gerações jovens anteriores... para mim foi o
grunge, para o meu padrinho e a tua mãe o punk e a pop portuguesa
pós-revolucionária, para o teu pai e os meus o rock sinfónico e a música de
intervenção, para os nossos avós o fado afrancesado da Amália; pego pela música
que é mais fácil, mais visível, mas a atitude nova reflecte-se em tudo: na
literatura e no cinema, na pintura e na maneira de vestir, na arquitectura e no
que comemos e no humor...
O que a cada vez dizemos aos nossos pais é que somos
absolutamente diferentes da geração deles, da geração anterior e isso é sempre
verdade (porque nunca passaria pela cabeça do teu pai ser vegan por mais que a
tua mãe o tolere pacientemente) e é sempre mentira porque a minha rebeldia em
ouvir Clash e grafitar paredes foi muito mais fácil do que a do meu pai em ler
Mao Tsé Tung e duma infância camponesa católica e grunha se puxar a uma
existência cosmopolita tolerante e suficientemente carinhosa para votar sim no
referendo para a despenalização do aborto.
Posto isto, cada geração traz qualquer coisa de novo e único
e absolutamente poético mas também traz uns rebites insuportáveis na sua self
sufficiency, nas suas pequenas certezas da ignorância dos 17 anos: os nossos
avós deram-nos a Amália nova mas insistiram na unidade pluricontinental da
nação e nas calças dos homens acima do umbigo; os nossos pais libertaram o país
mas torturaram-nos com os Abba; o meu padrinho e a tua mãe deram de comer ao
António Variações mas insuflaram os egos do Pedro Aires de Magalhães e do
Miguel Esteves Cardoso que eles continuam gordos hoje, apesar de não fazerem
nada há 30 anos; a minha geração também cagou as cidades todas com tags e volta
e meia meteu a espingarda na boca (olha o tio Kurt), mas demos-vos a Bjork e os
adultos poderem andar de t-shirt... a tua ilegalizou socialmente o racismo e a
homofobia e encheu as cidades de bistrots vegetarianos e alfarrabistas
recuperados, mas não pensem que não vão ter os vossos próprios rebites
insuportáveis: o Wes Anderson é um deles claramente, as barbas trabalhadas dos
hipsters outro evidente, o novo fado amaliano, a multiplicação explosiva de
géneros e classificações de orientação sexual, o cinismo político da papoila
que nem esquerda nem direita, o facebook, a Zooey Deschanel e a Lena Dunham
(bhhheerk e bhhhheeeeeerrrrkkk!!), a obrigatoriedade das tatuagens, os meninos
com fatinhos e lacinhos que nem os avós deles usariam e todas as meninas que
cantam musiquinhas acompanhadas a ukelele no youtube... todos temos pecados a
acertar com o futuro, até vocês meus anjinhos queridos, só pelo, diria o teu
amigo Conan Osiris, “querer ser excepcional”.
Preparem-se para o desprezo e revirar de olhos dos vossos
filhos,
são inevitáveis.
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