“Visita Guiada temporada 8 episódio 7 Rosa Ramalho” RTP2, 2018.
Vemos esta pérola e passo o
tempo a gritar “sulistas elitistas e (falsamente) liberais” que nem um autarca
grunho do norte... mas estava-se mesmo a ver...
Por partes: não sei se estás a
ver a Rosa Ramalho, mas a tia Rosa foi a maior e melhor e mais interessante
barrista que este país alguma vez produziu; no meu livro em termos escultóricos
está com o Soares dos Reis e o Cutileiro e poucos mais sem tosses nenhumas..
regra geral falo dela como o Picasso português porque há um abstracto e uma
absoluta soltura no trabalho dela que não é ser raro por cá.. é raro entre os
humanos.
Posto isto, o problema: o problema
é que a Rosa Ramalho era uma velhinha camponesa e analfabeta minhota no tempo
da outra senhora... que foi “descoberta” pelas elites artísticas e bem
pensantes (e esquerdistas) do Porto dos anos 60 e vista menos como uma ruptura
mas mais como uma expressão “muito genuína e pura” duma qualquer portugalidade
idealizada pelos intelectuais que só viam o povo quando o povo vinha com o
tabuleiro do chá das cinco... Como se a “descoberta” não lhe chegasse vê-se
depois coartada pelo regime como “expressão genuína e pura do povo” que estaria
necessariamente com o regime... o que lhe vale ser denunciada como
colaboracionista pelas elites bem-pensantes que anteontem lhe cantavam as
loas...
A tia Rosa, honra lhe seja
feita, caga nisso tudo e vende peças à Escola do Porto com a mesma desenvoltura
que cumprimenta o almirante Américo Tomás, vai almoçar com o antigo rei de
Itália ou ajuda a vizinha a depenar uma galinha... a cena dela era fazer
bonecos malucos em barro e é isso que ela faz, cada vez mais fantásticos.. até
ao fim em 1977.
Ora eu tinha esperanças (poucas
mas algumas, que sou um tótó) que já tivéssemos ultrapassado este fantástico e
claramente indevido complexo de superioridade da intelectualidade inútil que se
lhe permite falar de arte naïf, “outsider art” “art brut” ou “arte popular”
como se fosse um ramo menor, pequenino, deficiente, da arte a sério, maior e
mais séria que as elites inteligentes não produzem... Mas não... valham-se-me a
sacrossanta Paula Moura Pinheiro e o Alexandre Alves Costa (ilustre colega dos
teus pais e pai duma ilustre colega nossa) para me desenganarem com mais um
comprido programa NÃO SOBRE A ROSA RAMALHO (pouco quase sobre o trabalho dela)
mas enorme sobre quem a descobriu, quem a expôs, quem lhe comprou as peças,
quem a colecionou, quem se aproveitou dela; tudo gente interessante e de
qualidade como a Paula e o Alexandre e tu e eu.. todos claramente mais
interessantes que o génio artístico que era a tia Rosa lá de Barcelos deus a
benza... nós até sabemos repetir teorias mal cozinhadas com 150 anos do Rocha
Peixoto (como faz o Alexandre durante todo o programa para nos elucidar da sua
inteligência e erudição, perante uma Paula boquiaberta de admiração) que só têm
como mero efeito secundário retirarem toda e qualquer individualidade e agência
à tia Rosa (já para não falar de originalidade e génio) e a reduzem a um mero
veículo com um neolítico imaginado pelos inteligentes e que (sabemos nós hoje o
que não sabia o Rocha Peixoto nos 1800s e ninguém disse ao Alves Costa) nunca
existiu...
A “classe intelectual” da nação
não chega nem ao top 10 dos problemas deste país... mas a maior parte do tempo
não ajudamos muito, para não dizer nada, coisa nenhuma, nicles batatóides!
Fuck me! Bem podemos limpar as mãos à parede!!
Comentários
Enviar um comentário