Zé Mário Branco 1942-2019 Requiescat In Pace.
coerentemente Lisboa,
depois de meses e meses de secura,
chove,
chora.
Na semana transacta morreram a Teresa Tarouca, muito
fadinho ribatejano aristocrático para a minha boca, por isso deixei andar...
logo a seguir levaram-se-nos a Argentina Santos...
novamente... ao lado (demasiado chorinho chunga para mim), mas aí, dessa vez
(com o meu tio Alfredo e o Fernando
Alves de luto) achei que era inevitável o proverbial terceiro...
e pimba:
hoje acordo e fechou os olhos o tio Zé Mário.
E eu não sei fazer isto doutra maneira por isso vou fazê-la
da maneira como me sai, que é pessoal e egoísta e sobre mim e havia de pedir
muita desculpa se não me tivesse a cagar para as opiniões dos vindouros... o Zé
Mário fechar os olhos foi uma coisa que me aconteceu a mim!
Primeiro as partes pequenas: Lisboa é uma élite esquerdista
mínima e é claro que um filho do José Mário (para além de ser ex-marido da
antiga educadora da criança, a três vezes bendita Selma) é o actual professor
de teatro da criança e hoje era suposto criar a minha criatura até às 18:30 e
eu fico-me de olho no mail para ver se a escola nos chama mais cedo ou segura
os putos ou como é?!..
Depois, partes maiores:
coerentemente Lisboa chove,
chora.
foda-se lá o caralho!
o tio Zé Mário deixa-me um buraco muito específico no
coração: independentemente do esquerdismo (de cá donde eu estou a ver)
absolutamente amoroso e irrepreensível (os dois adjectivos anteriores
cuidadosamente escolhidos e totalmente assumidos), a verdade é que se calou um
poeta e músico enorme... e digam-me lá que o corpo morre mas a obra continua e
coiso e tal... quando são os dos outros reviro os olhos e não quero saber;
quando são os meus (como é o caso) é óbvia a insuficiência
do dito:
morreu-se-nos um poeta
morreu-se-nos um músico,
um dos bons nas duas categorias anteriores.
Em cima disso foi sempre um homem decente, acima de decente,
um camarada, um irmão...
um camarada da
Pátria imaginária
de consistência vária
Afirmação diária
do teu não.
Lisboa, coerentemente chora,
eu também.
Nem de propósito a professora da criança dá de trabalho de
casa (aos pais) um poema para levar amanhã;
eu obviamente transcrevo cuidadosamente este.
Era fatal.
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