“The Irishman” Martin Scorsese, 2019.
OK.. e agora temos este, este monumento. Vamos por partes:
primeiro o queixume que me fartei de ouvir antes sequer de o
ver... as 3 horas e meia de duração (o que o põe directamente entre o “Gandhi”
e o “Lawrence da Arábia”)... eu sei que hoje em temos todos attention spans
muito curtinhos, mas o comprimento duma coisa só é problema quando esta implica
sofrimento, não quando é prazer puro: meio minuto a levar porrada é muito longo
que um orgasmo de 3 minutos; e isto é só prazer.
2º ponto, o triângulo. E por triângulo quero dizer o espaço
entre os senhores De Niro, Pacino e Pesci, que é este filme se nos esquecermos
do génio que segura a câmara.. estes gajos, a bem ou a mal (e já vamos falar do
mal) fazem o filme... o De Niro e o Pacino estão no seu habitual registo
icónico (o Pacino é tão bom que faz o Pacino de sempre e convence-nos que o
Hoffa era o Pacino e isto é que é ser-se icónico)... mas a bomba, discreta
bomba que nos deixa de boca aberta é o Pesci! O cabrão do anão do Pesci, com a
ilusão da falta de esforço dos gigantes mostra-nos o que é ser um enorme
actor... é verdadeiramente hipnótico.
3º ponto: o elefante na sala, o processo de “de-aging”. Ou
seja como a narrativa se processa ao longo de mais de 40 anos e o trio
principal soma 231 anos os brincalhões do computador arranjaram uma solução
mágica para rejuvenescer os rapazes digitalmente: um De Niro como no “Padrinho
II” prometeu-nos expressamente um dos aprendizes de feiticeiro (no Padrinho II
o De Niro tinha 31 anos, neste tem 76!)... o que eles fazem é alisar as caras
dos gajos, colorir e descolorir e enrugar conforme a idade que lhes querem
dar... e o processo é discreto, os teus olhos deixam de o ver quando não o
procuras especificamente... qual é que é o problema? O problema é que eu me
lembro da cara do De Niro aos 30 anos (eu vi o “Padrinho II”.. para aí umas 200
vezes) e a diferença entre as duas caras não se reduz a ele ter ficado mais
pálido e engelhado... e mesmo que fosse reduzir um actor à sua cara é um
insulto à profissão... muito evidente quando a personagem nos seus 40 anos, com
a sua cara muito lisa e luzidia levanta as suas mãos muito lisas e luzidias mas
com os dedos tortinhos da artrose dum homem de 70 anos, já para não falar na maneira
como eles se movem (que obviamente mostra bem a idade que têm, há um
espancamento pelo De Niro especialmente doloroso.. para o De Niro, nunca tinha
ficado preocupado com o gajo que está a espancar) e claro, a voz... que
aparentemente ninguém em Hollywood acha que muda ao longo do tempo... é um
merdeiro, está fézinha bacoca na tecnologia.
Finalmente (para arredondar e acabar com o momento João
Lopes)... isto é um enorme filme, com todos os calcanhares de aquiles que lhe
possamos apontar é o primeiro filme sobre a máfia do Scorsese desde o “Casino”,
o primeiro depois dos “Sopranos” e isso nota-se, o mais fundo e sério deles
todos (à mão se semear ao ódio da maltinha dos filmes da máfia do costume pela
mesma razão que eles odeiam o “Padrinho III”... toda a gente adora a violência
e o glamour barato, ninguém gosta das consequências).... especificamente para
ti e o resto dos colegas: o que se faz, o que o triângulo faz, simplesmente com
o silêncio neste filme é absurdo.
absolutamente obrigatório:
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