Um buraco c/ a forma dum gato.
(“cada dia são cem” Zé Mário) Fiquei na vida c/ um buraco c/ a forma da sombra dum gato. Amar é submetermo-nos à dor, o Albert haveria de dizer q é aceitar, eu acho q é resistir, ao ABSURDO, a solução é a mesma: é preciso fazer p/ viver; sobra-me isto, fazer p/ ñ desistir de ser.
Porque sou velho e já aqui estive, sei q mais do q a dor q vem c/ vaga e me asfixia momentaneamente (“dona do dom” Bethânia), o drama é daqui a 32 meses quando me aperceber subitamente q estou a fumar sozinho à janela outra vez.
Garanto q as raparigas comam, durmam e caguem; ensopo-me em tarefas e vinho branco p/ abafar o impacto inicial, às vezes o altruísmo é puro egoísmo, pura fuga, ñ é a forma pior (“aerograma” Trovante); seguro a miúda no dia, a graúda os três dias seguintes, a gata quarta-feira o dia todo enquanto ela gane a esfregar-se na cama onde o ausente passava os últimos tempos. Respiro fundo, atabafo, agarro a parede.
Há um recanto camponês no meu toutiço q se envergonha p/ chorar + a criação q a minha avó preferida (“the mission” Morricone), mas ñ é indemne q se passam 16 anos c/ alguém e ou toda a gente q nos olha olhos nos olhos tem alma, ou ninguém a tem.
Um luto começa p/ ser um calhau no peito, concentradas a negação raiva negociação e depressão (a tua sobrinha fê-las todas sábado à noite e domingo de manhã), aceitação nunca vi, nunca senti (“noite” Mísia). O luto, a ausência do amado, começa p/ ser um calhau no peito, uma asfixia q impede até de gritar, lágrimas amargas q rosnam a sair dos olhos, um abanão p/ além do verbo; mas isso é o menos; o problema é depois, ser velho + uma vez, ñ ajudando, p/ menos esclarece: já sabemos o q aí vem.
O monstruoso calhau inicial concentra-se, adensa-se, e fica pequenino e mto duro e extremamente denso e pesado; um ínfimo seixo absolutamente resistente q levamos no bolso. (“são macaio” Zequinha) E junta-se ao resto do cascalho q levamos nos bolsos, como a Virginia, e é por isso q os velhos caminham curvados e arrastadamente, é o peso da gravilha q levam nos bolsos.
Mas estou a vaguear, isto é + simples do q toda esta pesporrência (“o sopro do coração Clã”)... o meu gato morreu-se-me, escrevo prq ñ me chega chorar, prq tenho de empurrar p/ lá a consciência do absurdo, o meu gato morreu-se-me e apesar da dor toda da ausência sei absolutamente q o q o amei absolutamente valeu a pena, por + q vá carregar um diamante de dor no bolso o resto da vida.
(“emboscadas” Sérgio G) Por enquanto tenho a dizer foda-se lá o caralho q dói, no longo prazo ñ interessa nada prq somos todos estrume, no entretanto obrigado a todos, até ao cabrão do Tareq, o Senhor me deu, o Senhor me tirou, bendito seja o nome do Senhor.
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