“La Reine Noire Catherine de Médicis” B. Lagrange & Fabien Lacaf, 1988; e as dissonâncias do costume.

Uma pessoa tem de se rir... passo a vida a dizer que só quero da BD “histórica” um retrato complexo e colado à realidade como a conhecemos e bem desenhado e logo que, finalmente, ma dão, qual menino de 6 anos, digo: não!! não gosto, quero antes ervilhas!!

Isto é tudo o que eu pedi e mais... aprende-se mesmo com isto; em cima do facto de eu saber que a Catarina de Médicis não se reduzia à bruxa ciumenta e fanática que envenenava toda a gente à sua volta, isto é deliciosamente desenhado, complexamente escrito, muito acima do que seria de esperar em 1988 (fiquei mesmo MESMO admirado quando lhe vi a data, achei que isto era, no máximo, de anteontem) para depois cair na quase desilusão comigo mesmo de, face ao retrato complexo da mulher real que ela foi.. uma altíssima-burguesa italiana entalada nas malhas extremamente sangrentas das contradições duma França rachada entre huguenotes ufanos e católicos marados, entre um Coligny e um Guise, a tentar boiar a dinastia, sempre a contragosto de toda a gente e sempre a servir de bode expiatório ideal na tripla de condição de mulher com poder, estrangeira e não exactamente velha fidalga... mesmo mesmo assim e com tudo isso, quando finalmente me dão EXACTAMENTE o que eu disse que queria, olho e digo não.

Os arquétipos não são reais per si por mais que o queira o Jung, os arquétipos são reais e funcionais e operantes na realidade porque nós os fazemos ser. Eu, no fundo no fundo no fundo não quero a Catarina de Médicis complexa que ela foi... eu quero a Catarina de Médicis da Virna Lisi na “Reine Margot”, eu preciso duma bruxa... há uma parte de mim insatisfeita com a desconstrução que clama pelo arquétipo. A Catarina de Médicis e a Lady Macbeth são o mal em forma de mulher; como o Ricardo III é o mal em forma de homem, meia forma deformed, unfinished, sent before time, a Margot e a Lucrezia são a sexualidade feminina descontrolada e logo perigosa... não me desconstruam os arquétipos que não há necessidade.. às vezes.


 

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