“O que nós cantámos pra aqui chegar” Mário Fernando, TSF, 2024.

Alguém teve esta boa ideia (50 discos essenciais nos 50 anos pós-25 do A.) e deu o trabalho ao Mário Fernando, não sei quem seja, suponho que não seja o da bola, imagino-o um moço da música lá na TSF ou pelo menos genericamente “da Cultura”... sempre uma coisa péssima de se ser numa redação da tuga...

O moço lá escolheu 50 discos e é claro que vai levar porrada, porque este tipo de exercício só serve para a malta se lembrar do que se esqueceu, se gabar daquilo em que o Mário acertou (segundo quem olha) e dar porrada no mono em tudo aquilo em que discordamos... por isso por partes:

Antes de mais o Zeca aparecer de nº 51 e o “Ao vivo no Coliseu” tresanda a afterthought e cop out... mas do mal o menos, o facto desta lista ser a coisa mais branca vinda de branco que faz um esforço da porra para ouvir alguma coisa que não seja exclusiva e agressivamente branca é mais mau de disfarçar... mas não stresses que não há racismo estrutural cá no jardim à beira mar (mal) plantado a não ser quando os deputados do Chega dizem “boa noite” logo pela manhã à Romualda, e mesmo assim é capaz de ser liberdade de expressão.

Mas estamos a falar de música... procedamos de cima para baixo, ou seja: aquilo de que eu nunca ouvi falar; seguido do ouvi dizer mas nunca escutei inteiro e anoto; seguido do concordo em absoluto e subscrevo; seguido de discutível mas prontos; seguido do tens de ‘tár a gozar comigo és um vendido que não merece ter orelhas; seguido do por conta de seres um vendido faltou-te o espaço para estes evidentes meu morcão. (isto hoje vai ser comprido)

 

AQUILO DE QUE EU NUNCA OUVI FALAR

nº 28 Ocaso Épico “Muito Obrigado” 1988. francamente curioso como sempre, pode ser uma pérola ou mais uma paixoneta injustificada da crítica, mas até ver é antecipação

 

OUVI DIZER MAS NUNCA ESCUTEI INTEIRO e ANOTO

nº 1 Vitorino “Semear salsa no reguinho” 1975 nº 12 Jáfumega “Jafu’mega” 1982 O tio Vitorino tem busto em pedra cá em casa, os Jáfumega lembro-me ligeiramente dalguma coisa quando era puto, mas duma maneira ou doutra estão anotados para serem escutados a posteriori

 

CONCORDO em ABSOLUTO e SUBSCREVO

nº 2 Banda do Casaco “Coisas do Arco da Velha” 1976 já lhes cantei as loas

nº 4 Trovante “Baile no Bosque” 1981

nº 5 Sérgio Godinho “Pano Cru” 1978 embora na realidade o “Pano Cru” seja o último álbum de antes do 25 de Abril, mas com o pai Sérgio é difícil porque o “Campolide” 1979, o “Canto da Boca” 1981 e o “Coincidências” 1983 são discos perfeitos... se desse para meter compilações (como a do Zeca parece indicar) mais valia meter simplesmente o "Noites Passadas" 1995

nº 7 Rui Veloso “Ar de Rock” 1980... indiscutível, mas fica de fora (pela regra aparente de só um disco por cabeça) o “Mingos & os Samurais” 1990 a ausência mais criminosa desta lista, que sendo menos influente que o “Ar de Rock” não deixa de ser a magna opus do tio Rui    

nº 8 Heróis do Mar “Heróis do Mar” 1981

nº 9 Fausto “Por este rio acima” 1982

nº 10 Xutos “Cerco” 1985... mais um indiscutível que tenho de discutir... eu sei eu sei e toda a gente mais velha do que eu tem toda a razão em discordar de mim, mas a verdade é que todos os mais novos (que já são mais) concordam comigo: um disco dos Xutos, um? Necessariamente o “88” 1988.

nº 11 Camané “Na Linha da Vida” 1998

nº 15 Zé Mário Branco “Ser Solidário” 1982... absurdamente indiscutível pois é, mas a regra “um por cabeça” espartilha-nos... este não é o disco de fecho do PREC?!.. eu teria metido o “Resistir é Vencer” 2004 que é muito mais destes 50 anos do que o “Ser Solidário”, mas esta dou de barato.

nº 17 Variações “Anjo da Guarda” 1987

nº 18 Mler Ife Dada “Coisas que fascinam” 1987

nº 23 Deolinda “Canção ao Lado” 2008

nº 24 Da Weasel “3º Capítulo” 1997

nº 26 Mão Morta “Mutantes” 1992

nº 27 Sam the Kid “Beats vol.1 Amor” 2002

nº 30 Sétima Legião “Mar d’Outubro” 1987

nº 32 Rádio Macau “Elevador da Glória” 1987

nº 33 Clã “Lustro” 2000... perfeito é verdade, mas isso também são outros quatro, o disco perfeito mais que perfeito é o “Rosa Carne” 2004 e esta é completo tiro ao lado do Mário!

nº 39 Mariza “Fado em Mim” 2002, também gosto mais do “Fado Curvo” 2003 mas esta dou de barato

nº 45 António Pinho Vargas “As Folhas Novas Mudam de Cor” 1987

nº 46 Ornatos Violeta “O Monstro Precisa de Amigos” 1999

nº 47 Abrunhosa “Viagens” 1994

 

DISCUTÍVEL MAS PRONTOS

nº 3 Carlos do Carmo “Um Homem na Cidade” 1977... enormes reservas com este senhor e a óptima imprensa que sempre teve

nº 6 UHF “À Flor da Pele” 1981 eu simpatizo com os UHF... se a lista fosse de 50 músicas dos últimos 50 anos eles apareciam de certeza (mas também os Trabalhadores do Comércio e a Mafalda Veiga), 50 discos? Nem pensar, isto é nostalgia boomer do Mário, o que me diz que o Mário é mais velho do que eu.

nº 13 Sitiados “Sitiados” 1992, eu estava lá e sei a loucura que foi o “Marinheiro”, mas o “E Agora?!..” 1993 é infinitamente superior, ainda estamos todos de luto pelo Aguardela, mas uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa

nº 16 GNR “Psicopátria” 1986 indiscutível não fosse o facto de aqui termos compilações e assim sendo, necessariamente, o “In Vivo” 1990 (não apareci na contracapa por duas cabeças!)

nº 19 Jorge Palma “Só” 1991, o tipo está maluco!! Só digo “Bairro do Amor” 1989

nº 20 Madredeus “O Paraíso” 1997... eu não digo? Eu ainda admitia um debate com “Os Dias...” 1987 por mais que a resposta correcta e óbvia seja necessariamente o “Existir” 1990, agora vir-me com o “Paraíso”, francamente..

nº 29 Humanos “Humanos” 2004, dúvidas estritamente metódicas. Para começar não sei se não viola o “um disco por cabeça” tanto por um lado como pelo outro, vá, iria de perfeita excepção à regra não fosse haver um capítulo inteiro de imprestáveis e outro de esquecidos

nº 37 Silence 4 “Silence Becomes It” 1998, outro que estava lá para ver o que foi... eu tenho de ir ouvir isto outra vez. Na altura pareceu a maior coisa desde o pão fatiado mas a verdade é que não o ouço há 20 anos sem saudades assolapadas e isso também é alguma coisa...

nº 42 Rodrigo Leão “Cinema” 2004 eu sei que toda a gente disse que gostou muito disto, mas para mim o Leão é tão chato sem o Ayres de Magalhães, como o Ayres de Magalhães é vazio sem o Leão... são os nossos Lennon e McCartney, juntos óptimo, separados mais vale tárem sossegados, tirando que os nossos não dão mesmo uma para a caixa

nº 43 Ana Moura “Desfado” 2012... absolutamente discutível, especialmente numa lista sem a Aldina Duarte, a Ana Moura tinha de aparecer, mas o “Guarda-me a Vida na Mão” 2003 é melhor

nº 44 Legendary Tigerman “Femina” 2009 muito muito bom (especialmente nos WrayGunn) lembro-me dele ao vivo na nossa cantina cheia de ratos ainda ele era um Paulo qualquercoisa de Coimbra... mas este disco são 3 músicas (metade meio roubadas) e a epítome do style over substance (algo meio indecoroso numa lista em que não vem o Úrias), por falar nisso tenho de ir apanhar isto, vês como estas listas são uma fonte de utilidade?

nº 49 Resistência “Ao vivo em Lisboa” 2016. Mesma ddúvida metódica que com os Humanos, de todo o modo o disco com alguma importância relativa é o “Palavras ao Vento” 1991, o resto foi esticar da miséria

nº 50 Júlio Pereira “Cavaquinho” 1981. este é daqueles que é como as minhas gaitas de fole, se calhar não sendo para todos é para alguns, para mim um disco inteiro a cavaquinho é uma espécie de tortura feita de propósito só para mim... numa lista sem o Rão Kyao (que toda gente ouvia, eu não que nunca gostei) vir o Júlio Pereira (que nunca ninguém ouviu) parece dever mais às habituais pinoquices da crítica do que a outra coisa qualquer...

 

TENS DE ´TÁR A GOZAR COMIGO...

nº 14 Pop Dell’Arte nº 25 Cool Hipnoise já disse o que tinha a dizer, nº 34 Dead Combo, nº 38 Belle Chase Hotel... tudo bandazinhas com mais ego do que música mas absolutamente idolatradas pela crítica com a qual de certezinha não têm contacto nenhum até porque a nação é enorme e sua elitezinha incestuosa e esfomeada não o é ainda menos... francamente estou agradavelmente surpreendido por não termos levado com génios musicais como o B Fachada, o JP Simões, o David Fonseca, os Linda Martini, os Capitão Fausto ou a Rita Redshoes, seja como for, mesmos estas quatro, numa lista destas? Só a brincar.

nº 22 Delfins, betinhos da Linha sem talento nem nada para dizer, mas com que levámos durante 30 anos e mesmo assim não nos convencemos e mesmo assim ainda aparecem nestas listas apesar de se terem tornado a shorthand para banda sem música que inexplicavelmente sobrevive (inexplicavelmente é como quem diz, eu expliquei em menos duma linha que toda a gente sabe)

nº 31 Carminho nº 40 Mafalda Arnauth nº 41 Gisela João.. no meu tempo (no antigamente) tínhamos uma legião de fadistas do povão e vá, espaço para uma betinha excepcional (e nunca jamais ½ hectare acima de Santarém)... e estávamos melhor, francamente, a Ana Moura faz funk, a Mariza canta mais no Japão do que cá, a Raquel Tavares apresenta programas da tarde de fim-de-semana e estes pancrácios a tentar vender-nos estas biscas, só faltou a Cuca Roseta e a Kátia do Cavaco para compor o ramalhete, foda-se lá o caralho!

nº 35 o Zambujo nº 36 os Gift ... que é como quem diz música merda que vende porque a publicidade funciona... faltaram o Miguel Araújo, os Amor Electro e o João Pedro Pais, não, o JP Pais não, que esse manda um cheirinho a povo que por mais anúncios a bancos e supermercados que faça nunca chega às alturas de listas destas.

Finalmente: nº 48 o Salvador da Eurovisão, iá meu, faltava cá o viralatismo nacional mais valeta alguma vez visto... qual a melhor música mandada para a Eurovisão cá pela Nação?.. deixo a dúvida à Rafaela... se a pergunta é a que uma vez ganhou? Nem pensar nisso! From the top of my head lembro-me de duas da Simone melhores que a xaropice do Sobral e da mana, mais uma do Tordo e uma do Paulo de Carvalho... ok depois do 25 de Abril, porra há mais! porra, até os Da Vinci foram mais interessantes do que o Salvadorzinho (a dos Da Vinci é súmula nunca escrita da autoimagem nacional pós-colonial, não precisas de mais nada)... mas a caução “lá de fora” é qualquer coisa, até quando tão minimamente pouco como a Eurovisão... daí a fingirmos que ouvimos um álbum inteiro do Salvadorzinho... é indecoroso.

 

FINALMENTE,

POR CONTA DE SERES UM VENDIDO FALTOU-TE ESPAÇO PARA ESTES:

começando por calar a boca evidente de que o que se segue é a música de que o Tiago gosta e o Mário Fernando se esqueceu, começo por apontar 4 coisas, que eu desprezo do fundo das minhas cócleas, e que numa lista destas eram absolutamente obrigatórias: José Cid, as Doce, Carlos Paião e Mafalda Veiga.

Fora isso... aparentemente nos últimos 50 anos em Portugal não houve música do povão mal lavado que nunca viu o interior da Gulbenkian e por isso não contam para a história o Marco Paulo ou o Tony Carreira ou a Ágata ou, os maiores deles todos (os únicos originais): o Quim Barreiros e o José Malhoa.

Também somos todos, cá em Portugal, sempre e exclusivamente brancos, por isso não houve Bana nem Bonga nem Tito Paris, nem General D, nem Black Company, nem Kussondulola, nem Sara Tavares... nem sequer Buraka Som Sistema (e isto vindo dum pula de quase 50 anos que não ouve rap, nem nacional nem estrangeiro).

Não houve punk para além dos inícios dos Xutos, porque não houve Censurados, Mata Ratos, Tara Perdida... foda-se não houve sequer Peste & Sida!!

No fado houve Arnauths e Carminhos, mas não houve o Fernando Maurício (o FERNANDO MAURÍCIO!!!), não houve Bia, nem a Aldina Duarte!!!, nem a Mísia, nem o Paulo Bragança, nem o Ricardo Ribeiro, nem a Raquel Tavares nem a Sara Correia!

Não houve Vicious Five!

Não houve Terrakota!

Não houve Vozes da Rádio!

Não houve Conan Osiris!

Não houve Samuel Úria!

Não houve ENA PÁ 2000!!

Não houve GAITEIROS DE LISBOA!!!

Não houve A NAIFA!!!

NÃO HOUVE TRÊS TRISTES TIGRES!!!!!

NÃO HOUVE MARIA JOÃO A CANTAR PARA O PIANO DO MÁRIO LAGINHA... foda-se brilhante Mário Fernando continua a fazer listas para nós aprendermos!!!

NÃO HOUVE CARLOS PAREDES.

CARLOS PAREDES!!!

METEMOS OS delfins E DEIXÁMOS DE FORA

O CARLOS PAREDES!!!

and I rest my case.



 

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