“A Arte de ser Português” Teixeira de Pascoaes, 1915.
this is a doozy, como dizem os ianques...
O Teixeira de Pascoaes é um poeta de fim de século que eu
nunca li (e daí não tenho nada a dizer), família aristocrática terratenente de
entre o Douro e Minho, juiz, que algures depois da República lhe deu para o
eremitismo nortenho e mais ao menos desapareceu mas lá nos foi legando umas
pérolas lá de cima...
O livro é me oferecido pelo Miguel Ângelo em 2002 pelos anos
(eu já te falei do M.A.) o Miguel é um absoluto génio mas completamente maníaco
da Direita católica mais espumante possível... entre nós, para além de amizade
sincera (fui eu que o salvei das matronas do PSR quando ele resolveu aparecer
na FCSH com a t-shirt anti-aborto a uma semana do primeiro referendo) não havia
mais do que lentas provocações... e daí não o ter lido na altura. o Miguel
queria conversa e eu sou pouco de morder o isco.
Entretanto passou mais duma década e li aquela coisa
da tua mãe e lembrei-me do Pascoes outra vez, a sensação de “eu tenho essa
porra algures por aqui”, e era verdade, andava por cá, e li-o.
Primeira coisa: isto é admiravelmente bem escrito, há um
cuidado com o meio (a língua) que é verdadeiramente de poeta (e digo isto sem
ter lido um poema dele que seja)... isto é daquelas coisas que se a nossa
Direita não fosse tão impenitentemente analfabeta (fora o Miguel Esteves
Cardoso, o Jaime Nogueira Pinto, o Mexia e o Miguel Ângelo) seria perigosa, mas
assim sendo reduz-se a uma provocação do Miguel Ângelo ao colega mais
esquerdista que ele se lembrava (e mesmo assim com mais de 15 anos de
antecipação, o cabranote).
Mas falando do objecto:
Isto é uma tentativa de charge a uma descrição psicológica
da nação e em si é fraquinha à brava... antes de mais porque navega mal (apesar
de parecer bem porque é muito bem escrito) entre o “eu sei” e o “eu acho”... o
“eu acho” é esmagador, e etnograficamente o objecto é um pedaço de merda porque
claramente todas as ideias estavam formadas e solidificadas antes de irmos à
procura de exemplos que as justificassem; e o ponto de vista do terratenente de
Entre Douro e Minho é esmagador... o povão é muito lindo e extremamente
clarividente mas isso não justifica nenhum tipo de ataque ao principio
hierárquico da sociedade rural do século XIX.
Etnologicamente, as ideias do Teixeira de Pascoaes são
vertíveis directamente das do Herbert Spencer (não só a sobrevivência do mais
apto mas também a ideia do supraorgânico, dum zeitgeist avant la lettre) e do Lewis
Henry Morgan (as maluquices do LHM sobre “arianos” e “semitas”) que, honra lhe
seja feita, acabam muito menos perniciosas (leia-se racistas) no Teixeira de
Pascoaes, do que no qualquer outra utilização que delas tenha sido feita.
Conclusão: isto é um livro inútil; que a direita nacional
poderia utilizar para os piores fins se deus nosso senhor não nos tivesse feito
a graça da direita ser tão iliterata e que, só por ser tão bem escrito,
continua a merecer um lugar na estante...
só extremamente escondido lá para trás.
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